Semana passada teve um momento mágico. Tá, mágico é exagero, mas foi uma sensação boa. Era sexta-feira 13 e chovia em Campo Bom. Chuvinha da boa, para aliviar o calor e a estiagem. E, como sempre, fomos para nossa casa ajudar os pedreiros com a reforma. Para não sair da rotina de ser desastrado e do mito que é o “dia do azar”, pisei onde não devia e acabei quebrando uma tampa de um ralo que estava “disfarçada” com um azulejo. Bom, como não era possível trabalhar na chuva, todos foram embora e fiquei sozinho na casa. Montei um cavalete na área dos fundos e comecei a lixar as portas e as vistas das aberturas. Vamos pintar de branco (a maioria das paredes será branca, que irá combinar com os rodapés brancos, que combina com o teto, sacou?).
E lá estava eu, pra lá e prá cá com a lixa, num vai e vem infinito e olhando a chuva. Inevitável pensar na vida e nos dias que passaram, amigos que se perderam por aí (ou se acharam), enfim, o pensamento voou longe longe longe... E fazendo aquele trabalho manual lembrei da minha infância e dos brinquedos que montava com pouquíssimas ferramentas. Era um MacGyver tupiniquim. Abrindo parênteses: reza a lenda que MacGyver é o pai da POG (Programação Orientada a Gambiarras), mas essa é outra história. A minha história começa com um martelo que soltava o cabo o tempo todo. Cara, era até hilário, não fosse triste. Para fixar o martelo no cabo eu “pregava” parafusos com uma pedra, preenchia os espaços com outros pregos e tchãram! Tá, ficava meio torto, mas funfava. Enton pegava meia dúzia de pregos tortos e enferrujados (que eu ia recolhendo da rua), uma madeira rachada e com três ou quatro rolamentos montava um carrinho de lomba show de bola. E não é que ele andava mesmo? E era competitivo. Sério, rolava altas corridas na calçada do Seminário Batista. Volta e meia alguém batia no poste ou em uma árvore. É que logo depois da curva (entende-se por curva dobrar a esquina) tinha um poste de luz, bem no meio da calçada (gambiarra pura). Se viesse muito rápido era inevitável bater no poste ou em uma árvore.
Vieram outras e outras lembranças e depois de certo tempo fiquei pensando nisso: de onde vêm estas lembranças e memórias? Imagino que deva existir no “universo infinito” da nossa memória um espaço especial com vários baús onde fica armazenado cada momento da nossa vida. E por ser um lugar especial, a consciência tem acesso restrito, conseguindo abrir somente os baús que não estão trancados. Alguém deve estar se perguntando: “mas e as chaves? Quais são as chaves que abrem os demais baús? Como, em um momento aleatório a gente lembra algo que nem imaginava ter vivido e estava esquecido no passado?”
As chaves são os cheiros, sabores, músicas ou sons, cores, momentos e por aí vai. São infinitas combinações e cada uma é atraída por um baú que é automaticamente aberto e a lembrança voa como se fosse um pássaro engaiolado que ganha a liberdade de forma repentina e inesperada. Algumas vezes, dentro dos baús existem outras chaves guardadas que abrem outros baús e assim nossas memórias vão surgindo, uma após a outra, de forma meio que randômica.
Antes que alguém pergunte a resposta é não! Não tenho assistido ou lido Harry Potter ultimamente.
“A recordação é uma cadeira de balanço balançando sozinha”
Mário Quintana
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