De volta aos loucos pensamentos, meu amigo imaginário me perguntou por que eu fico escrevendo sobre minhas lembranças e idéias em um blog que quase ninguém lê. Sim, é o mesmo amigo que fez inúmeros e incessantes pedidos para relatar a história do bode. Bom, quem está lendo isso agora já conhece um segredo meu – meu amigo. Não, ele não tem nome nem forma física. Talvez tenha, talvez seja parecido comigo, talvez seja eu mesmo, mais velho ou mais novo. Tanto faz.
Mas o fato é que escrevo para reviver lembranças e dividir um pouco do que penso. No filme Um Sonho de Liberdade, um dos personagens diz a certa altura que os presos ficavam felizes quando chegava um colega de cela, pois viam uma oportunidade de contar sua história novamente. Na verdade eles não queriam dividir sua história, queriam reviver momentos, acrescentando, quem sabe, um pouco de lenda. Vai ver que é por isso que comecei a escrever cartas há anos atrás para pessoas desconhecidas, mas que sabiam mais coisas de mim do que muitas pessoas que me rodeavam. Amizades também crescem com pena e tinta...
Ao longo dos anos e das cartas, fui colecionando pensamentos e algumas poesias em uma agenda. Começou com os pensamentos que o Mendes Ribeiro escrevia em sua coluna diária, no jornal Correio do Povo. Gostava do que ele escrevia. Às vezes eram sobre política, outras sobre relatos de leitores, experiências e também sobre suas idéias. E a coluna sempre terminava com um pensamento e seu autor. Eu adorava. E recortava. E colava em uma folha de ofício. E as folhas foram se acumulando e as colagens se misturando. Nas cartas que eu escrevia, sempre colocava um pensamento e meus amigos começaram a fazer o mesmo e foi aí que comecei a transcrevê-los para uma agenda. Na verdade é mais que uma agenda, são palavras que ajudaram a formar aquilo que sou hoje. Os pensamentos e frases que ali estão têm seu significado e importância.
E este é mais um pedaço dessa colcha de retalhos, que aos poucos vai formando uma imagem, meio distorcida, confusa. Termino essa postagem com um poema do Mário Quintana que adoro e sinto uma pontinha de inveja por não o ter escrito.
O Mapa - Mário Quintana
Olho o mapa da cidade
Como quem examinasse
A anatomia de um corpo...
Como quem examinasse
A anatomia de um corpo...
(É nem que fosse o meu corpo!)
Sinto uma dor infinita
Das ruas de Porto Alegre
Onde jamais passarei...
Das ruas de Porto Alegre
Onde jamais passarei...
Há tanta esquina esquisita,
Tanta nuança de paredes,
Há tanta moça bonita
Nas ruas que não andei
(E há uma rua encantada
Que nem em sonhos sonhei...)
Tanta nuança de paredes,
Há tanta moça bonita
Nas ruas que não andei
(E há uma rua encantada
Que nem em sonhos sonhei...)
Quando eu for, um dia desses,
Poeira ou folha levada
No vento da madrugada,
Serei um pouco do nada
Invisível, delicioso
Poeira ou folha levada
No vento da madrugada,
Serei um pouco do nada
Invisível, delicioso
Que faz com que o teu ar
Pareça mais um olhar,
Suave mistério amoroso,
Cidade de meu andar
(Deste já tão longo andar!)
Pareça mais um olhar,
Suave mistério amoroso,
Cidade de meu andar
(Deste já tão longo andar!)
E talvez de meu repouso...
Este poema tinha em um quadro na parede da minha casa, quando eu era criança! Sinto cheiro de terra molhada, de bolo de chocolate e dos meus cachorros (!) quando leio ele! É dez.
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